segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Uma porta e uma janela

     Todas as histórias começam por Era uma vez... Esta será mais uma dessas histórias que começam por Era uma vez... Todas essas histórias que começam por Era uma vez... têm um final feliz. Esta, que também irá começar por Era uma vez... Talvez não tenha um final feliz, porque talvez se desconheça ainda o seu final.

     Era uma vez... Uma menina sonhadora que falava com as mãos. Ela sonhava em falar com as mãos toda a sua vida, e acima de tudo, sonhava que toda a gente a pudesse compreender sem qualquer tipo de esforço ou comentários desagradáveis - O que é que ela está p'rali a dizer? Será que nos está a pedir alguma coisa? Se calhar até nos está a chamar de estúpidos e nós nem sabemos.
     A menina chorava toda a noite agarrada a uma tartaruga de peluche que a tia lhe tinha oferecido no Natal passado. A menina sentia que o seu peluche era o único amigo que tinha, pois sem ser os seus pais, era o único que a compreendia.
     Ela contava-lhe todos os seus sonhos falando com as mãos, e parecia que a tartaruga lhe sorria quando os seus olhos brilhavam como duas estrelas cadentes numa noite escura. Certo dia contou-lhe o que gostava de ser quando fosse grande - Cantora. Nesse dia, a tartaruga não sorriu. A menina pensava que podia cantar com as mãos, tal como falava, e que toda a gente podia percebê-la e cantar com ela. Mais tarde, nesse mesmo dia, a menina deitou-se e abraçou a tartaruga com tanta força que quase lhe saltavam as patas de trás! Pousou-a no seu colo e disse-lhe com as mãos - Nunca vou poder seguir os meus sonhos, pois não? Não achas que as pessoas deviam falar com as mãos? Elas são todas diferentes de mim. Nessa noite a tartaruga chorou em vez de sorrir, porque sabia que não eram as outras pessoas que eram diferentes, era a menina que era diferente de todas as pessoas. Por ser diferente, era especial.
     A menina ia crescendo, continuando a sonhar, continuando a falar com as mãos, continuando a não ser compreendida.
     Um dia a menina sentou-se em frente à televisão e reparou que alguém falava com as mãos. A menina esboçou o maior sorriso que algum dia fez em toda a sua vida! Correu para os braços da mãe com a tartaruga debaixo do braço e gritou com as mãos - Mãe, mãe! Na televisão falam com as mãos tal como eu! Afinal as pessoas não são diferentes, há pessoas como eu. A mãe sorriu e disse-lhe com a voz - Pois é, meu amor, pois é... e a menina logo a interpelou - Então mãe, porque não me respondes? Não tenho razão? Já posso cantar com as mãos, as pessoas vão entender-me.
     A menina voltou a sonhar alto, crescia e sonhava cada vez mais alto! Os horizontes alargavam-se, as mãos falavam cada vez mais depressa, o sorriso era cada vez maior, mas no fundo, as pessoas que não eram diferentes e que falavam com as mãos continuavam a ser muito poucas.
     A menina cresceu e tornou-se mulher. Não realizou o seu sonho de cantar com as mãos, nem o sonho de ser compreendida por todas as pessoas que ela achava diferentes. Cresceu, e tal como a tartaruga o sabia naquela noite em que não sorriu, a menina-mulher percebeu que era ela que era diferente.
     Sentava-se à janela do seu quarto e cantava com as mãos, fingindo ter uma plateia enorme a aplaudi-la e cantando com ela as suas canções que ela própria produzira. A porta do seu quarto estava sempre aberta enquanto ela imaginava o seu pequeno grande sonho de infância. Às vezes, desatava a correr porta fora até ao jardim que ficava em frente à sua casa e chorava.
     Chorava, e ninguém a ouvia chorar.
     Cantava, e ninguém a ouvia cantar.
     Só a tartaruga a ouvia.

1 comentário:

  1. Minha querida!

    Obrigada pelas palavras de conforto e de encorajamento. Sei que posso não te compreender a 100%, mas acredito que te consigo compreender um bocadinho. Sei que passaste por coisas difíceis e que ergueste a cabeça e continuaste, admiro-te por isso! Agradeço bastante pelas palavras que me disseste e sei que me conseguiste compreender.
    OBRIGADA!

    GOSTO MUITO DE TI!

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